Quantcast
Channel: Blog de Cinema » brian percival
Viewing all articles
Browse latest Browse all 5

A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS/Crítica – a amarga narrativa da morte

$
0
0

 

Tendo a morte como narradora da história,  A Menina que Roubava Livros, a adaptação do romance do escritor australiano Markus Zusak, expressa a amargura das guerras e a grandeza humana pela busca do conhecimento, tendo a morte, a narradora da história, como elemento de busca da reflexão das ações do homem

Sophie Nelisse em A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS (2013), de Brian Percival

Sophie Nelisse em A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS (2013), de Brian Percival

Um pequeno fato. Você vai morrer. Apesar de todos os esforços, ninguém vive para sempre, diz a morte, narradora e comentador de A Menina que Roubava Livros (The Book Thief), sob a direção de Brian Percival. Ele é um premiado realizador de comerciais e oriundo da televisão britânica onde obteve reconhecimento pela série Downtown Abbey, vencedora do Emmy e outros troféus.

Coprodução estadunidense-alemã rodada no ano passado na Alemanha, falada em inglês e orçada em US$ 35 milhões, A Menina que Roubava Livros era uma das mais aguardadas adaptações literárias em andamento. Afinal, o romance do australiano Markus Zusak, 39, lançado em seu país em 2005 e no Brasil em 2007, vendeu, até agora, mais de oito milhões de exemplares em todo o mundo, esteve por sete anos na lista dos best-sellers do The New York Times, campeão de venda no Amazon.com, além de ter ganho 12 prêmios internacionais.

Obviamente, os executivos da Fox de Hollywood e dos estúdios Babelsberg da Alemanha, anteviram no sucesso literário a oportunidade de transportá-lo, o sucesso, também para o Cinema. Assim, destinaram 35 milhões de dólares para a produção, em um orçamento que é até modesto para um filme de guerra. Mas, nem sempre grandes livros, sejam pela qualidade da obra ou pela sua receptividade junto ao público, resultam em filmes notáveis ou em sucesso nos cinemas. É o que ocorre com A Menina que Roubava Livros.

Liesel também rouba livros das fogueiras de Hitler

Liesel também rouba livros das fogueiras de Hitler

Primeiro porque simplesmente não interessou ao público dos EUA, o qual, em 96 dias de exibição, recolheu, até agora, nas bilheterias, meros US$ 20,9 milhões – e precisa do mínimo de US$ 105 milhões para empatar o seu custo. E parece que também não está despertando o interesse no mercado internacional, onde está indo melhorzinho, com US$ 28,8 milhões arrecadados.

Por que isso acontece com um filme que adapta um incontestável sucesso literário em todo o mundo? Não há resposta para isso. Apenas quer dizer que não existe e nenhum produtor de Hollywood tem a fórmula perfeita para criar um filme de sucesso. Essa decisão cabe ao público. E nem sempre este tem sido generoso com as ofertas, principalmente com aquelas que custam centenas de milhões de dólares.

Menos metafísica, mais filosofia

Nem um livro de sucesso, por mais estrondoso que seja, nenhum roteiro, por mais original que pareça, é garantia de sucesso no cinema. Ali, a determinação pertence ao público, não aos escritores, diretores, produtores ou escritores. Pode-se, aventar, que o problema esteja no próprio livro, que é de uma amargura constante e cuja maior originalidade reside em ter a morte como o narrador e comentador dos acontecimentos. Não li o romance, por isso prefiro me ater à obra cinematográfica. E me parece que as intervenções da morte, com as suas preocupações mais filosóficas do que metafísicas, alavancam a história e realçam a centralização no persistente tema da condição de mortalidade do homem. A narrativa, centralizada durante a Segunda Guerra Mundial, de 1938 a 1943, quando os aliados passam a bombear as cidades alemãs, é impecável na descrição dos horrores da perseguição dos nazistas aos judeus e, principalmente, em expressar a dor humana perante em sua tenaz luta pela sobrevivência – a qual, no filme, se apresenta como impossível.

Sophie Nelisse, Emily Watson e Geoffrey Rush: a família nos tempos do nazismo

Sophie Nelisse, Emily Watson e Geoffrey Rush: a família nos tempos do nazismo

Pode ter sido essa amargura da inevitabilidade da morte – a qual apenas poupa a doce e engelical Liesel (em atuação comovente da canadense Sophie Nelisse, de apenas 13 anos, que já demonstrara o seu talento em Monsieur Lazhar – o que Traz Noas Novas) e o jovem judeu Max (Ben Schnetzer) -, que tenha afastado o público. Mas, seria simplesmente absurdo se afirmar taxativamente ter sido este o motivo. Na verdade, não se sabe.

A Menina que Roubava Livros e um breve resumo do enredo, que se se inicia em 1938 quando Hitler planeja anexar a Thecoslováquia e invadir a Polônia, o que ocorreria no ano seguinte. Incapacitada de cuidar dos filhos, a senhora Miminger leva-os para uma família alemã, mas apenas a menina, Liesel, sobrevive. Rosa e Hans Hubermann a adotam, com Hans ajudando-a na alfabetização. Ela faz amizade com um colega de escola, Rudy Steiner, e conhece Frau Heinrich, a mulher do prefeito, que possui uma gigantesca biblioteca em casa, onde vai regulamente para ler, até o dia em que o marido dela descobre a expulsa. Para continuar a ler, ela passa a roubar os livros. Nesse interim, os Hubermann acolhem um fugitivo judeu, Max, que é escondido no porão.

Sophie Nelisse, Liesel, e

Sophie Nelisse, Liesel, e

O filme, em si, é riquíssimo na distribuição de diversos temas. Entre eles, o progresso humano através da cultura, expressada pela leitura de livros; o relacionamento confiável, contido na dedicação de Rudy (Nico Liesch) em proteger Liesel; e das mudanças que uns podem promover nos outros  – a presença de Liesel vai despedaçando as cascas de rudeza e a crueldade com as quais Rosa Hubermann (Emily Watson) trata o marido e os semelhantes; além, é claro, do mais equilibrado dos personagens, o sanfoneiro Hans, vivido por um excelente Geoffrey Rush.

Outro tema de A Menina que Roubava Livros, a impossibilidade de fuga da realidade na qual os personagens não conseguem escapar, mas que pode ser compreendida e até tentada de ser superada através do afeto e da cordialidade – velho trato humanista. Quanto a isso, a personagem Rose Hubermann, é o grande trunfo do filme em seu processo de mudança.

Há, também, outras qualidades em A Menina que Roubava Livros, como a referência histórica que garoto Rudy faz de Jesse Owens (1913-80) – o atleta afro-americano que venceu o alemão Lutz Long, atleta de Hitler, nos Jogos Olímpicos de Verão de 1936 e conquistou, ali, quatro medalhas de ouro; o desfile de livros ao longo da narrativa, como O Homem Invisível, de H. G. Wells, e, entre outros, O Manual do Coveiro, O Dar de Ombros, O Assobiador (recusado e depois roubado), O Carregador de Sonhos, Uma Canção no Escuro e Dicionário e Tesauro Duden Completo, além de Minha Luta, de Hitler. Procurei pelos autores, mas, lamentavelmente, não consegui informações.

Ben Schnetzer e Sophie Nelisse: o conhecimento nos livros

Ben Schnetzer e Sophie Nelisse: o conhecimento nos livros

Destaca-se, ainda, a relação de Liesel com a mulher (Kirsten Bock) do prefeito, cuja biblioteca vai ser a abertura do conhecimento do mundo para ela, numa jornada que, em sua infância, se concluíra com a escrita de seu Diários da Morte, o qual redundará em seu ingresso no mundo literário com o título de A Menina que Roubava Livros.

Inegavelmente, o filme é de uma amargura perene, concordando com a afirmação de que este mundo é de expiação, conforme expressam algumas religiões. Mas, apesar de finalmente superar a sua simpatia por Liesel e levá-la consigo quando ela já está aos 90 anos, o verdadeiro personagem do filme, a Morte, vitorioso em tempos de Hitler e implacável ao longo da história, afirma que é assombrado pelos humanos.

Essa assombração vem das suas impossibilidades: uma de obter o conhecimento, e outra, de descrever as maravilhas e as tragédias que presencia ao longo do tempo, em livros, como eles, os humanos, a alcançam e fazem, tocando as suas próprias almas. Daí, que tem um prazer egoísta do conhecimento no qual ela viveu ao ponto de pensar o que era viver. Assim como os humanos têm a impossibilidade de viver para sempre, a morte também tem as suas inquietações.

Em sua narrativa amarga e tocada ao som da melancólica trilha sonora de John Williams, A Menina que Roubava Livros tem a maestria de expressar que, pela história que constroem, entre as guerras e a construção do conhecimento, os humanos, realmente, são de assombrar.

BLOG COTAÇÃO ÓTIMOFicha técnica

BLOG QUADRO COTAÇÕESA Menina que Roubava Livros
The Book Thief
EUA-Alemanha, 2013
Direção: Brian Percival
Elenco: Sophie Nelisse, Geoffrey Rush, Emily Watson, Nico Liersch, Roger Allam (narrador), Rainer Reiners, Gotthard Lange, Heike Matasch e Oliver Stokowki
132 minutos
Fox
12 anos

 

 

O post A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS/Crítica – a amarga narrativa da morte apareceu primeiro em Blog de Cinema.


Viewing all articles
Browse latest Browse all 5

Latest Images





Latest Images